Infelizmente, venho de uma família onde o suicídio pode-se, por assim dizer, ser considerado lugar comum. Pessoas novas, às vezes belas, aparentemente sem tantas dificuldades financeiras, inexplicavelmente suicidam, deixando atrás de si, rastros de dores, remorsos, revoltas, incertezas e buscas de explicações desencontradas ou inexistentes, enfim, angústias existenciais, que no meu entender, inspiram outros familiares para prática de ato semelhante.
Mas afinal, por que as pessoas suicidam? Por que umas pessoas encontram forças suficientes para enfrentar e até superar seus dilemas existenciais e outras não? É lícito suicidar? E Deus? Sendo Ele, onipresente e diante de pessoas, por vezes, bondosas em extremo desespero, por que não intercede para evitar a consumação do suicídio? Seria por respeito ao livre arbítrio dessas pessoas ou para não agir de forma discriminatória em favor de umas e não de outras, as quais não julgassem merecedoras da sua misericórdia? Hoje, é aceito que, as pessoas suicidam devido à redução dos neurotransmissores, prejudicando a respostas pelos receptores neuronais. Seria somente por isso? Qual seria o olhar da Filosofia Clínica, num momento existencial tão angustiante, considerando a sua ênfase em não censurar qualquer comportamento pessoal? E o da Bioética, qual seria? O de censura?
Na verdade, o que se sabe em relação ao suicídio, é que são tantos “por quês”, ensejando respostas as mais diversas, porém, em sua maioria, insatisfatórias para justificar uma atitude tão agressiva e estranha do homem. Enfim, um crime praticado pelo ser humano.
Em Ética a liberdade é importante, mas não constitui o único valor. A questão do suicídio é mais complexa do que uma mera questão pessoal, ou seja, de um direito em que se escolhe livremente. A vida conta, com certeza, mas a responsabilidade social também o faz. Por isso o suicídio é tido como uma prática criminosa, embora existam em alguns países do mundo, iniciativas que defendem a sua descriminalização.Também na Ética Cristã, a vida é um dom de Deus e não algo em relação ao qual as pessoas tem a decisão final. É bem verdade que a liceidade do suicídio já fora admitida, como entre os estóicos, em situações de grande sofrimento onde o controle pela razão não fosse mais possível e, entre os gregos e romanos antigos, por causas nobres ou como demonstração de sabedoria, como o fez Sócrates em 399 a.C. Entretanto, tal pensamento tende ser uma concepção do passado, embora, tenhamos ainda que lidar com os homens-bombas, nos “suicídios espetáculos”, do fanatismo religioso e do terror.
A Bioética, escopando-se ações legalmente responsáveis e moralmente aceitáveis em favor da vida, deverá manter-se vigilante, impondo sua censura, mesmo que o suicídio venha ser descriminalizado. Aliás, descriminalizar um ato, não implica em automaticamente transformá-lo em um direito. Uma pessoa pode querer se matar e até ser capaz de fazê-lo, se o suicídio deixar de ser um crime, porém, isso não significa que ele tenha o direito de fazê-lo.
Incapazes de comunicar a própria dor, o que se passa na estrutura de seu pensamento, os suicidas recorrem a algumas fantasias, às vezes num acesso inconsciente, para justificar a si mesmos a sua autodestruição. E assim, a busca de uma outra vida, passa ser uma das fantasias mais comuns. Fragmentados existencialmente, já quase fora de si, eles se sentem “livres” para atacarem a si mesmos.
A raiz do sofrimento é a perda da dimensão do sentido da pessoa e, este é sempre pessoal, pois relaciona com o “eu” de cada um. Um ego fraco não tolera frustração, não tem capacidade de espera e se torna impotente para lidar com as questões de limites ou com os “nãos” que a vida impõe, enfim com os problemas da vida. Os distúrbios psiquiátricos, em especial, a depressão grave que concentra a pessoa nos aspectos negativos da vida, acabam por encerrar os suicidas em estado de solidão existencial, fragmentando suas singularidades pessoais, fazendo com que se exasperem e se matem..
Acredito que mais que a Psicologia ou a Psicanálise, a Filosofia Clínica, imparcial, sem censura, analisando o ser humano, existencialmente, em seu todo, aprofundando no estudo da estrutura do pensamento das pessoas e nos submodos de sua exteriorização seria extremamente salutar. Intensificando as buscas dos pré-juizos para serem devidamente afastados, numa acurado detalhamento das intersecções vivenciadas pelo o homem, ela poderá ser a principal interlocutora de um diálogo franco, porém suave, que possa culminar com a reestruturação psicoemocional e afetiva da pessoa.
Enquanto a Bioética, censura o homem por não reconhecer nele o direito de se matar, tentando enfim preservar a vida em sua dignidade, impondo a ele limites, a Filosofia Clínica, vai também propugnar pela vida, porém, sem censura, buscando o homem a partir de sua fragmentação, recompondo-o em sua existência e o tornando um cidadão apto para viver, eliminando o estado de confusão mental pelo qual passa o suicida diante de iniciativas tão complexas e contraditórias a conciliar: o tirar a vida e morrer. Por fim gostaria de lembrar o pensamento de dois grandes filósofos contemporâneos a respeito do suicídio: “O suicídio nos tenta com uma promessa de uma liberdade ilusória do absurdo de nossa existência. E no fim não passa de uma fuga de nossa responsabilidade de enfrentar – ou aceitar – que o absurdo vai continuar” (Albert Camus). E para Sartre: “O ato – do suicídio – é uma oportunidade de afirmar a essência individual em um mundo, sem Deus”.
sábado, 5 de abril de 2008
Parte do Meu trabalho sobre o Suicídio
Postado por
Leopardo
às
4/05/2008 09:22:00 AM
Assinar:
Postar comentários (Atom)


Nenhum comentário:
Postar um comentário